Rizoma Logo

vol 12 • 2012

Image

Uma prática docente inspirada no “jeito de ser docente” de Paulo Freire

Uma prática docente inspirada no “jeito de ser docente” de Paulo Freire

Ana Maria Saul
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- Brasil
Av. Parada Pinto, 3558 apto 142 São Paulo -Horto Florestal – 02611 001
Fone/fax +55 11 2232-7876

pdf

Resumo

O texto apresenta a prática que venho desenvolvendo como docente da Cátedra Paulo Freire na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) – Brasil, inspirada no ‘jeito de ser docente’ de Paulo Freire. Inicialmente, vou fazer um acercamento ao tema, contando como foi o meu encontro e convivência com Paulo Freire, na PUC/SP, no período de 1980 a 1997, para depois dizer da minha prática docente, que vem sendo recriada a cada semestre, na perspectiva de experienciar a possibilidade e o valor de trabalhar com a proposta freireana na sala de aula.

Palavras-chave

Prática docente; Paulo Freire; referenciais freireanos na sala de aula.


Primeiras palavras

O objetivo desse texto é apresentar e discutir o trabalho que desenvolvo como docente e pesquisadora na Cátedra Paulo Freire da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) - Brasil, com a intenção de mostrar aos leitores como venho trabalhando, a partir do que aprendi com o ‘jeito de ser docente’ de Paulo Freire.

Inicialmente, quero dizer como foi o meu encontro e convivência com Paulo Freire, na PUC/SP, no período de 1980 a 1997, para depois apresentar a minha prática docente, que vem sendo recriada a cada semestre, na perspectiva de experienciar a possibilidade e o valor de trabalhar com referenciais freireanos na sala de aula.

O ‘jeito de ser docente’ de Paulo Freire

Paulo Freire foi professor da PUC/SP, no Programa de Pós-Graduação: Educação (Currículo), depois de sua volta do exílio, pelo período de 17 anos (1980 -1997). Tive a grande felicidade de partilhar com ele, pelo período de quase duas décadas, o espaço da sala de aula, dirigindo os seminários das terças – feiras à tarde e por isso posso testemunhar a coerência entre o seu “fazer docente”, originado de sua reflexão sobre sua prática como educador e do diálogo constante que manteve com educadores/as e educandos/as de diferentes países do mundo, e as suas proposições politico-pedagógicas.

Quero destacar, nesse relato, o que aprendi com o “jeito de ser docente” de Paulo Freire. Começo, no entanto, fazendo um acercamento ao tema para dizer, muito brevemente, como foi o meu primeiro encontro com Paulo Freire. Eu o conheci, provavelmente como muitos educadores/as, por meio de seus livros proibidos, no Brasil, na década de 1960 [1], quando ele estava no exílio. Somente pude ter acesso aos seus escritos em reuniôes secretas do movimento universitário. Em 1979 tive a chance de ver Paulo Freire ser recebido no teatro da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, quando ele retornou do exílio.

Passei a trabalhar com Paulo Freire em 1980 [2], convidado pela PUC/SP, no Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo. Eu era responsável por uma das disciplinas obrigatórias do curso e ele ministrava uma disciplina optativa em torno da temática da Educação Popular. Fomos apresentados, formalmente, em uma reunião administrativa do Programa e, uma semana depois, quando eu me encontrava sozinha, na sala de professores, em um horário de almoço, revendo algumas anotações para entrar em sala de aula, fui tomada de surpresa. Paulo Freire entrou na sala, cumprimentou-me e disse: - Menina, tu sabes fazer aquele plano de curso que temos que entregar à coordenadora?[Paulo Freire trazia uma ficha em suas mãos] . Os temas de que eu vou tratar, disse ele, estão aqui[mostrou-me a ficha]; não sei como colocá-los na forma do plano que foi pedido; tu podes me ajudar? Eu não sabia bem como reagir. Com um misto de respeito, distinção e timidez, disse-lhe que eu sabia o que se costumava pedir na PUC/SP como plano de curso e que poderia tentar colocar as suas decisões sobre o curso, no formato de plano; disse ainda que eu lhe mostraria antes da entrega, para que ele conferisse os registros e fizesse as alterações necessárias. Assumi essa incumbência com grande responsabilidade. Parece que eu estava adivinhando que esse encontro seria o início de uma relação privilegiada e que frutificou em uma grande amizade e possibilidade de um trabalho conjunto, singular. Passamos, então a nos encontrar, freqüentemente; o plano de curso foi um bom pretexto para isso.

Em 1983, o Programa de Pós – Graduação no qual trabalhávamos passava por uma reformulação curricular; como uma das novas propostas, foram definidos seminários para orientar a pesquisa dos alunos e alunas. Esses seminários seriam conduzidos por uma dupla de docentes, conjuntamente. Paulo Freire e eu fomos incumbidos de coordenar os seminários, com essa nova configuração. Começamos a trabalhar juntos às terças-feiras, dirigindo esses seminários.

No início de cada semestre tínhamos um longo encontro de planejamento desses seminários. Para o planejamento geral do semestre, Paulo Freire costumava me chamar para um almoço ou um café, em sua casa; depois partíamos, como dizia ele, para fazer o planejamento. Ele procurava sempre ouvir o que eu estava pensando em relação ao próximo semestre; daí discutíamos bastante e chegávamos às propostas. Ele fazia questão de ressaltar que os nossos desejos, os nossos sonhos de professor/a seriam confrontados com os sonhos dos alunos e alunas e por isso propunha que a primeira coisa que faríamos em sala de aula seria discutir, com os/as discentes, a proposta de trabalho dos seminários. Considerávamos, para a elaboração do plano, as expectativas do alunado, as possibilidades de tratamento da temática e as avaliações dos semestres anteriores, realizadas pelos/as participantes do seminário. Esses diálogos com Paulo Freire sempre foram muito produtivos, ricos e fraternos.

No primeiro dia de aula ele se preocupava inicialmente em ouvir os/as alunos/as para que as suas necessidades e expectativas estivessem contempladas na proposta de trabalho a ser desenvolvida no semestre. Isso era feito numa sala de aula arrumada em círculo, ambiente propício ao diálogo, onde todos os participantes podiam se ver face a face e onde Paulo Freire podia “tocar” algumas pessoas da roda, que estavam a sua direita ou a sua esquerda, colocando delicadamente a mão sobre seus ombros; fazia isso em alguns momentos, num gesto muito espontâneo, como se quisesse ser melhor entendido ou, ainda, para chamar o seu/a interlocutor/a à participação. Quem conviveu com Paulo Freire e teve a oportunidade de estar mais perto dele, seguramente, vai se lembrar da expressividade dos seus gestos. Ele era um homem que falava com as mãos.

Na condução do trabalho de sala de aula Paulo Freire propunha que, num primeiro momento, ouvíssemos as preocupações de investigação, de pesquisa dos alunos/as; os seus sonhos, como ele dizia. Mesmo que esses projetos fossem embrionários, ele fazia questão de estimular seus autores/as a dizer os seus sonhos, ainda que estes não estivessem detalhados ou totalmente claros. A partir do relato dos projetos, ou intenções de pesquisa, passava-se a um segundo momento em que se trabalhava com as diferentes temáticas que daí emergiam, encontrando-se os eixos importantes de cada um desses projetos e os “fios comuns” entre eles. Deste modo eram aprofundadas as temáticas fundamentais que contribuíam para os diferentes projetos. Além de selecionar os tópicos básicos de discussão, Paulo Freire considerava importante propor aos alunos e alunas que se exercitassem na produção escrita durante o curso e discutissem as suas produções em sala de aula. Ele me dizia: Vamos propor ao grupo que, em cada sessão, a cada aula, eles/as possam reagir não só oralmente, no momento da aula, dizendo o que pensam a respeito das temáticas, mas vamos, também, desafiá-los/as para escrever pequenos textos, uma página que seja, e, na sessão seguinte nós ouvimos essas páginas e nos manifestaremos em relação a elas.

De um modo recorrente, nas análises, surgiam, com prioridade, os seguintes temas: justiça social, poder, liberdade, democracia, utopia, ética, construção do conhecimento, compromisso social, formação do/a educador/a, educação como ato político, leitura da realidade, valores do ser humano.

Paulo Freire fazia questão de insistir sobre esses temas. De modo coloquial ele nos dizia: Vocês que estão comigo há muito tempo, certamente já começam a adivinhar o que vou responder, porque faço questão de insistir sobre alguns temas.

Esse modo de “ser” e de “fazer” de Paulo Freire, centrado em proposições fundamentais de sua obra, como: o respeito ao educando, a dialogicidade, a importância de partir do conhecimento dos educandos/as no processo de ensino aprendizagem, a defesa da autoridade do professor e não do autoritarismo, a politicidade da educação e, em especial, a seleção de conteúdos significativos na escola foram, por vezes, criticados por intelectuais que defendiam a tendência histórico-crítica na educação. Em nosso país, essas críticas foram fortemente acirradas na década de 1980. Não foram raros os momentos em que essas críticas foram trazidas para a sala de aula, por alunos/as, e mesmo por outros/as professores/as que encontravam esses questionamentos em alguns textos ou em palestras proferidas em congressos. Paulo Freire não se cansava de retomar as explicações, aprofundando os seus argumentos. Todavia, não deixava de se referir a uma justa raiva em relação às críticas que lhe faziam sem fundamentação.

A presença de Paulo Freire na sala de aula sempre foi muito querida, marcante e significativa. A sua atuação na aula era discreta. Apesar de ele saber que a sua palavra fazia diferença, com humildade autêntica, raramente era o primeiro a falar. Exercitava, assim, um dos saberes que em seu último livro apontou como necessários à prática educativa: saber escutar. Ouvia a todo/as atenta e respeitosamente e ficava à vontade para interferir, sempre que julgasse oportuno, ou quando alguém do grupo a ele se dirigia. Nesses momentos, ouvíamos sua voz mansa que revelava, porém, uma postura forte que convidava a pensar sobre os desafios por ele apresentados, na direção de uma leitura crítica do mundo, na defesa intransigente da ética do ser humano e da luta a favor dos seres oprimidos.

O clima democrático e cordial da sala de aula permitia que os/as alunos/as se experimentassem na produção da escrita e, ao mesmo tempo, pudessem dizer de suas dificuldades.

Paulo Freire, por vezes, fez exposições muito interessantes a respeito da superação das dificuldades para a produção de um texto. Ele contava como escrevia; dizia que às vezes se punha diante de uma página e ficava tempo sem que realmente a possibilidade da escrita viesse. Com isso revelava, na prática, a coragem que o/a professor/a precisa ter, segundo ele, de se expor diante da classe, demonstrando os seus sonhos, a sua ideologia, a sua compreensão da realidade e da produção do conhecimento e também os seus sentimentos.

No penúltimo semestre em que trabalhamos juntos ele estava escrevendo o livro Pedagogia da Autonomia, concluído em setembro de 1996. Em uma das aulas desse semestre, uma das alunas, ao apresentar a página que escrevera para a discussão na classe, (essa era uma página da dissertação de mestrado que estava produzindo) a aluna assim se dirigiu a Paulo Freire: - 0lhe, Paulo, às vezes eu tenho uma sensação de que aquilo que escrevi não vale muito a pena e tenho vontade de rasgar tudo e jogar no lixo. Paulo Freire disse a ela em tom incisivo, indignado e muito bem humorado: - Não, não faça isto! veja bem, eu tambémestou escrevendo um livro; eu vou dizer para você que ele até pode ser um livro rasgável, não sei ainda. Às vezes eu também sou tomado pelo sentimento de que o que a gente está produzindo nem sempre é totalmente bom, nem sempre a gente está totalmente satisfeito com o que faz.

Em quase todas as semanas que se seguiram a esse fato, pedíamos notícias a Paulo Freire sobre o seu livro rasgável. Numa tarde de terça-feira ele chegou e disse: hoje eu quero dar uma notícia a vocês, já terminei aquele livro rasgável.

Ao comentar sobre a sua forma de produção, Paulo Freire sugeria ao grupo-classe alguns procedimentos para enfrentar as dificuldades da escrita. Uma das coisas que ele dizia dar muito certo era voltar, no dia seguinte, ao que se escreveu no dia anterior, reler o que já se fez, como um aquecimento para rever, reformular ou ir adiante. Mencionava constantemente outra prática dele e que fazia questão de recomendar: o uso de bons e diferentes dicionários. Tive a oportunidade de visitá-lo em sua casa, no escritório onde ele escrevia, e observei que ele mantinha os dicionários muito próximos de sua escrivaninha, bem à mão, para utilizá-los a todo o momento. Paulo Freire não se cansava de mencionar a importância do uso dos dicionários de língua portuguesa para que a escrita fosse estética. Ele prezava muito a qualidade da linguagem e não se furtava de, no momento oportuno, sempre com muita cortesia, fazer o que chamava de certas sugestões de linguagem aos/às alunos/as. Dizia fazer isso como necessidade, como método, para garantir a boniteza da linguagem. Nessas situações ele fazia questão de dizer que a seriedade do educador não deve ser separada da alegria, não deve ser separada da estética. Ressaltava ainda que ser político, no sentido de ter um direcionamento claro, um compromisso claro com a transformação da sociedade na direção da democratização e da justiça social, não nos exime da responsabilidade de fazer isto de uma forma estética, de uma forma bonita, alegre e prazerosa. Ele dizia, ainda, que não é preciso ser sisudo para ser sério. É muito possível e desejável que se faça educação com bom humor, alegria e amorosidade.

Os encontros com Paulo Freire sempre foram reflexivos, interessantes, fraternos e surpreendentes. Era admirável a sua clareza de análise do mundo! Inquieto e instigante, buscava a coerência entre sua prática e os seus escritos, mostrando-se indignado com as injustiças sociais. Revelava constantemente, coragem, humildade e esperança.

A grande oportunidade que tive de conviver e aprender com Paulo Freire, na Universidade, ampliou-se e se aprofundou quando fui por ele convidada para dirigir a reorientação curricular da Secretaria Municipal de Educação do Município de São Paulo [3] e coordenar o programa de formação permanente dos/as educadores/as. Trabalhar na equipe de Paulo Freire, Secretário da Educação foi uma experiência inusitada.

Em nossos encontros de quase todas as manhãs, no seu gabinete, em um edifício da Avenida Paulista [4], eu encontrava um homem alto, elegante, de terno e gravata, cabelos brancos, quase sempre longos, com suaves ondulações sobre os ombros. Bem disposto, chegava com pontualidade nas primeiras horas da manhã. Mostrava sempre, em nossos diálogos, a sua preocupação com os aspectos mais gerais da política educacional. Surpreendia-me, no entanto, o modo criativo e concreto com que ele tratava o cotidiano. Quem imagina o Secretário Paulo Freire como alguém que manejava tão somente as diretrizes mais gerais da Secretaria da Educação, engana-se.

Com a experiência dos seus setenta anos e com a autoridade de um saber, reconhecido por muitos povos do mundo, tinha sempre algo novo a propor, na perspectiva concretizar, na prática, a política mais geral, avançando passo a passo, rumo à construção de uma escola pública, popular e democrática.

No dizer coloquial de Paulo Freire, era preciso “mudar a cara da escola”; no entanto era fundamental que a escola quisesse mudar a sua cara e por isso precisava ser respeitada, consultada, fazendo-se sujeito de sua própria história. Por isso ele indagava com detalhes sobre cada um dos programas que estavam em desenvolvimento, sob a minha coordenação. Ele ficava absolutamente atento à leitura da realidade, aos avanços e dificuldades, demonstrando profundo respeito pela história e vivendo um tempo de mudança com paciência/impaciente. Entusiasmava-se com cada pequeno avanço; o relato de simples ações de escolas que evidenciavam estar caminhando na direção de uma escola séria na produção de conhecimentos e, ao mesmo tempo, alegre e democrática, era o suficiente para mantê-lo animado e estimulado. Desafiava-me sempre com novos projetos, quase todos, ousados. Parecia que reservava a noite para sonhá-los e explodi-los, no dia seguinte, com o raiar de um novo dia, numa atmosfera que tinha clareza de propósitos, determinação, alegria e esperança.

A cada novo projeto exibia no olhar o brilho e a excitação de um menino. Toda a sua criação ousada, todavia, era cercada por uma moldura democrática onde o diálogo sempre foi a pedra fundamental.

Paulo Freire queria ouvir sempre e atentamente a posição de sua equipe sobre todas as propostas. Ouvia ponderações, recriava suas propostas, estimulava e dava espaço a novas proposições; externava preocupações, colocava parâmetros.

Experimentei com Paulo Freire o verdadeiro sentido do que é participação. Muito ao contrário da falsa participação que manipula colaboradores, centralizando todas as decisões nas mãos do chefe e delegando apenas a execução de tarefas, a participação, na equipe de Paulo Freire, assumiu o mais radical dos significados, caracterizando-se verdadeiramente como uma participação em nível político. Isto significou, efetivamente, compartilhar decisões. E observe-se que chamar a equipe para integrar o processo de tomada de decisão implicava, necessariamente, uma divisão do poder do dirigente. É isto! Paulo Freire dividia o seu poder de Secretário de Educação com sua equipe, na Secretaria. Fazia isso com tranqüilidade mas, sobretudo, por convicção política. Importante destacar que isso não o ameaçava ou o tornava menos poderoso. Ao contrário, como ele mesmo dizia em tom muito bem humorado : sou o secretário que menos tem poder e por isso, contraditoriamente, sou o que tem mais poder.

No cotidiano difícil, demandante, desafiador da educação na cidade de São Paulo, na construção de uma gestão democrática, pude vivenciar, com Paulo Freire, a sua disposição para o diálogo, a tolerância, uma paciência/ impaciente e um toque de paixão em tudo o que ele fazia.

Convivi com Paulo Freire até poucos dias antes de sermos privados de sua presença física no mundo. Estávamos planejando, nessa ocasião, juntamente com um grupo de estudantes da PUC/SP, uma viagem ao Algarve/Portugal, onde Paulo Freire receberia mais um título de Doutor Honoris Causa. Lá faríamos um Seminário para professores e professoras, e nos encontraríamos com o professor António Novoa, da Universidade de Lisboa, que estava organizando a viagem, em Portugal, os contatos com a Universidade de Algarve e o lançamento de um livro para homenagear Paulo Freire. [5] A alegria e animação de Paulo Freire, em relação a essa viagem, eram indescritíveis. Ele fazia planos, discutia o roteiro, planejava passar em alguns locais para voltar a comer algumas comidas típicas, tomar vinho do Porto e ver lugares bonitos. Enfim, seria uma festa!

Com o impacto e a tristeza pela falta de Paulo Freire, fiquei muito tempo sem poder falar sobre ele, em público, sem que as lágrimas me viessem à face.

Paulo Freire deixou saudades pela sua lucidez de interpretação dos fatos do mundo, pelo seu poder de indignação, por seu contagiante amor à vida e ao ser humano, por sua luta incessante pela justiça, pela liberdade e por sua presença solidária e amiga.

Somente um ano depois de seu desaparecimento, quando ‘a saudade ficou mais mansa e o coração passou a ser envolvido em veludo’ é que os professores/as da PUC/SP tomaram uma decisão mais proativa, em relação ao legado freireano. O Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo propôs, então, à Reitoria da Universidade, a criação da Cátedra Paulo Freire.

A Cátedra Paulo Freire da PUC/SP: o contexto de minha prática docente

Criada no 2º semestre de 1998, sob a direção do Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, [6] a Cátedra Paulo Freire vem sendo construída como um espaço privilegiado para o desenvolvimento de estudos e pesquisas sobre a obra de Paulo Freire e a partir da mesma, focalizando suas repercussões na educação e sua potencialidade de fecundar novos pensamentos e novas práticas. A Cátedra foi criada para homenagear Paulo Freire. Prestamos essa homenagem do jeito que entendemos que Freire gostaria, ou seja, estudando com rigor o seu pensamento, para compreendê-lo e recriá-lo. Reinventar o legado freireano significa, nessa Cátedra, fazer uma releitura crítica da obra de Freire cuidando, pois, de não descaracterizar as suas propostas principais, tendo em vista discutí-las frente aos novos desafios do mundo atual. E, sobretudo, construir e sistematizar uma práxis coerente com os princípios fundamentais de sua obra. Rejeitamos, pois, qualquer compreensão de reinvenção que possa significar rompimento com o pensamento do autor para que se ‘faça tudo de novo’. Também repudiamos movimentos e práticas que, em nome da reinvenção, aproximam ou reduzem a filosofia e a pedagogia de Freire a métodos e técnicas, muitas delas chanceladas por modismos e pela ‘grife’ das chamadas inovações pedagógicas.

Nessa perspectiva, a Cátedra Paulo Freire da PUC/SP vem trabalhando com os referenciais freireanos como subsídios para a docência, para a pesquisa e para a análise de políticas públicas em educação, na formação do educador - pesquisador, no nível da Pós-Graduação.

A Cátedra oferece um curso, a cada semestre letivo [7], com atividades que se desenvolvem em 17 encontros presenciais, com a duração de três horas/aula semanais. Confere aos participantes três créditos acadêmicos, de acordo com o regulamento do Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo.

Desde 1999, quando assumi, com responsabilidade e prazer, a coordenação da Cátedra, t enho trabalhado com a inspiração dos referenciais e da prática de Paulo Freire.

Ao longo dos semestres tenho buscado aprofundar a compreensão da Cátedra como um espaço no qual:

  1. a construção do conhecimento se faz coletiva e cumulativamente, de modo a não ser, apenas, um “espaço de passagem” para os/as alunos/as, um lugar onde se constrói/busca conhecimento, levando-se o que se considera importante, e sim um lugar em que, ao mesmo tempo “se leva” e “se deixa” o conhecimento produzido, para construções posteriores. Para isto tem sido necessário desenvolver registros do que se faz, sistematizar e divulgar as experiências e as produções;

  2. a docência seja coerente com os princípios de construção do conhecimento constitutivos da pedagogia freireana:

    • respeito ao conhecimento dos/as educandos/as;
    • dialogicidade;
    • construção coletiva do conhecimento;
    • construção de conhecimento crítico-transformador;
  3. o ensino e a pesquisa sejam tratados como relação indissociável e dialética.

Em uma busca vigilante de coerência com esses princípios, necessidade sublinhada por Paulo Freire, a minha prática docente tem sido no sentido de criar/ recriar uma metodologia de ensino-aprendizado crítico-transformadora na educação superior. O trabalho que tenho construído/reconstruído, nesse espaço acadêmico, tem a perspectiva de não dicotomizar ensino e pesquisa, teoria e prática.

Como nos lembra Freire na Pedagogia da Autonomia,

(...) conceber a prática de ensino como um processo de permanente investigação significa assumir o posicionamento epistemológico em que o educando é o sujeito de seu conhecimento, estando sua aprendizagem associada a um processo constante de pesquisa sobre sua realidade. Em outras palavras, significa não distanciar a prática educativa do exercício da curiosidade epistemológica dos educandos

(FREIRE, 1997)

No contexto de ensino - aprendizagem, a prática é trazida para a sala de aula por meio das intencionalidades de pesquisa dos/as alunos/as, de representações da realidade e saber de experiência feito dos educandos/as-pesquisadores/as. Dessa forma, ensino e pesquisa se interpenetram, mediados pela teoria e prática.

A metodologia de trabalho que desenvolvo considera, pois, múltiplos itinerários de estudo e pesquisa dos/das alunos/as. Quero significar com isso que diferentes focos de trabalho podem ser desenvolvidos simultaneamente, de acordo com os interesses e demandas dos objetos de investigação dos/as alunos/as, sempre, no entanto, referenciados pela pedagogia freireana.

O ponto de partida, o primeiro momento dessa metodologia é a investigação temática. Esse trabalho consiste em identificar os diferentes interesses de pesquisa de mestrandos/as e doutorandos/as, bem como suas práticas de pesquisa, para problematizar os limites de suas concepções e dos temas de investigação que pretendem desenvolver.

O segundo momento consiste na primeira imersão no pensamento freireano. Proponho aos educandos/as uma aproximação primeira à obra freireana. Aqui, os alunos/as podem escolher uma obra da bibliografia indicada pelo professor ou revisitar alguma obra que já conhecem, com o objetivo de encontrar, na leitura de um dos textos de Paulo Freire, até três conceitos de seu interesse, tendo como critério o tema/problema de sua pesquisa. Esse é primeiro desafio que lhes é apresentado. Em alguns semestres os/as alunos/as estranham a liberdade que lhes dou de escolher a obra. Esse estranhamento se dá pelo fato de não ser comum, entre os/as professores/as brasileiros/as permitir aos alunos/as escolherem a obra que querem ler. Os/as estudantes, ainda têm se mostrado curiosos/as, com respeito ao resultado que essa prática terá, em termos do conjunto do grupo-classe.

Eu tenho deixado, deliberadamente, a discussão desses estranhamentos e curiosidades para o terceiro momento do trabalho, quando a prática trará evidências que podem justificar os argumentos de minha decisão.

O terceiro momento de trabalho consiste na socialização e discussão, no grupo de alunos/as, do que denomino inventário de conceitos composto pelo conjunto de escolhas dos participantes da classe. Aqui já se inicia a análise de compreensões advindas das leituras, uma vez que solicito aos/às participantes que justifiquem as suas escolhas e às relacionem aos seus respectivos problemas de pesquisa. De modo geral, a composição do inventário de conceitos não se esgota em uma única aula, quer porque o número de alunos é maior, em determinados semestres, quer porque as justificativas e questionamento, já nesse momento, se fazem adensadas.

Ao finalizar a discussão sobre o inventário de conceitosé possível esclarecer a classe quanto à minha decisão de estimular a escolha da obra pelos/as alunos/as. É possível observar que o inventário contém alguns conceitos que coincidem na seleção dos/as alunos/as e que são oriundos de fontes de leitura diferentes. Isso ocorre, explico eu, pelo fato de que Paulo Freire insiste em retomar, um conjunto de conceitos e idéias- força que são fundamentais em sua obra. Ele assim o faz, não com a intenção de repetir os conceitos mas , sim, para esclarecê-los mais, para aprofundá-los, ou articulá-los em outro contexto de pensamento. Desse modo, é possível encontrar, em toda a obra de Paulo Freire, a referência a um conjunto de conceitos que são centrais e explicitam o seu pensamento. É com surpresa que os/as alunos/as constatam essa característica dos escritos freireanos.

O momento seguinte de trabalho, o quarto dessa metodologia, consiste em organizar os conceitos com o grupo classe para um trabalho coletivo, de estudo e de aprofundamento, segundo os critérios de escolha dos conceitos, aproximações possíveis entre as escolhas feitas e os temas de pesquisa, visando a definir os itinerários de pesquisa, dos/as participantes do grupo.

O quinto momento caracteriza-se pelo aprofundamento dos conceitos. Proponho que esse trabalho seja desenvolvido em pequenos grupos que se organizam de acordo com os conceitos e temas de pesquisa que se aproximam. Nesse momento indico obras específicas de Paulo Freire para cada um dos subgrupos da classe para que os conceitos selecionados possam ser estudados.

Neste estágio do trabalho o objetivo é a elaboração de uma produção escrita que é socializada e discutida na classe. Para chegar a essa produção, vários caminhos têm sido trilhados. Em alguns semestres os grupos prepararam seminários, com diferentes linguagens e os apresentaram para o debate crítico-reflexivo com a classe. Esses seminários tem se mostrado bastante produtivos e vêm cumprido, de fato, a intenção de semear ideias. Diferentes recursos e produções têm sido trazidos para esses seminários que têm se mostrado como produções de conhecimento significativo e criativo. A elaboração do que tenho chamado de tramas conceituais, a partir de categorias centrais do pensamento de Paulo Freire, associadas a diferentes conceitos selecionados de sua obra, permitem a explicitação do caráter relacional dos seus escritos. Essas tramas conceituais, semelhantes a mapas de conhecimento, constituem importantes recursos cognitivos, quer para analisar, quer para propor práticas e políticas educacionais ou, como nos diz Paulo Freire, cumprir o compromisso político de denunciar e anunciar.

As produções escritas dos/as alunos/as têm tido várias destinações. Uma delas é a própria pesquisa do/a pós-graduando/a que freqüenta a Cátedra (dissertação ou tese). Uma segunda destinação tem sido a inscrição/apresentação do texto, elaborado e discutido, em eventos nacionais e/ou internacionais. Uma terceira possibilidade para divulgação desta produção tem sido a publicação da mesma em livros organizados pela Cátedra. Neste caso, os textos têm sido submetidos a uma nova instância de análise, também com caráter pedagógico, podendo voltar ao autor, para revisões e ou complementações [8].

As diferentes pesquisas que vêm se desenvolvendo no âmbito da Cátedra Paulo Freire articulam investigações de mestrandos/as e doutorandos/as [9] que participam do Programa de Educação: Currículo da PUC/SP se inserem em um amplo projeto temático em torno do grande objetivo de identificar e analisar a influência do pensamento de Paulo Freire na educação brasileira, a partir da década de 1990, visando a contribuir para a recriação de políticas e práticas educativas numa perspectiva crítico-emancipadora.

O pensamento de Paulo Freire está sendo pesquisado com especial destaque para as políticas e práticas de currículo da educação pública, a partir da década de 90. A grande intenção dessa pesquisa é a de que os seus resultados possam subsidiar o fazer político-pedagógico de gestores e docentes de redes públicas de ensino comprometidas com a democratização da educação.

Para a concretização desse intento, várias ações subsidiárias estão em desenvolvimento:

  1. Construção de um banco de dados sobre as pesquisas realizadas em sistemas de educação pública, no Brasil, que se pautam/pautaram em referenciais freireanos, a partir da década de 90.
  2. Documentação e publicação dos resultados dessa pesquisa e divulgação dos mesmos em um website interativo da Cátedra Paulo Freire, de modo a permitir consulta permanente e interação entre pesquisadores e gestores públicos.
  3. Articulação de pesquisadores de várias regiões do País que investigam a influência de Freire na educação e, em especial, nos sistemas públicos de ensino.
  4. Divulgação dos resultados dessa pesquisa em publicações e em eventos nacionais e internacionais.

Quero destacar a criação, dentre essas ações subsidiárias, de uma rede freireana de pesquisadores, a partir desse projeto matricial da Cátedra Paulo Freire da PUC/SP. A proposta prevê que docentes de diferentes regiões do País, vinculados a cursos de Pós-Graduação, em Educação, pesquisem o legado de Paulo Freire e sua reinvenção, nos sistema de educação do Brasil. Os resultados dessas pesquisas serão sistematizados de modo a demonstrar como os referenciais freireanos vêm sendo utilizados e recriados, seus efeitos e as condições necessárias para o trabalho com os mesmos.

Espera-se poder oferecer subsídios aos educadores das redes de ensino, responsáveis por decisões e implementação do currículo e formação de educadores, a partir do retorno e discussão dos achados dessa investigação. Para tanto, os resultados dessa pesquisa serão sistematizados e registrados em um instrumento virtual, no site da Cátedra Paulo Freire, [10] visando a oferecer subsídios para gestores de políticas públicas e demais pesquisadores compromissados com o currículo, na perspectiva crítico-emancipatória. É dessa forma, também, que a academia pode cumprir a sua responsabilidade com a sociedade concretizada, nesse caso, como uma efetiva relação dialógica com as redes públicas de ensino.

Pode-se afirmar, a partir dos resultados que têm sido evidenciados nas pesquisas conduzidas até o momento, e pela ampliação dos movimentos que se ampliam, em torno do pensamento freireano, que a conclusão de Moreira (2010), assinalando ter sido a pedagogia freireana uma referência fundamental para as políticas de currículo nos anos 90, também se anuncia nesse novo milênio. O pensamento de Paulo Freire segue sendo, pois, uma matriz importante para o desenvolvimento de políticas de currículo que assumem o compromisso com a educação democrática, defendida por todos aqueles que proclamam o direito e o dever de mudar o mundo, na direção de um projeto social fundado na ética do ser humano e em princípios de justiça social e solidariedade.


Bibliografia

APPLE, W. Michael e NÓVOA, António (1998). Paulo Freire: política e pedagogia. Porto: Porto Editora.

FREIRE, Ana Maria Araújo (2001). A Pedagogia da libertação em Paulo Freire. São Paulo: UNESP.

FREIRE, Paulo (1991). A educação na cidade. São Paulo: Cortez Editora.

Freire, Paulo e Shor, Ira (1987). Medo e ousadia: o cotidiano do professor. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

FREIRE, Paulo (1997). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

FREIRE, Paulo (1994). Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

FREIRE, Paulo (1968). Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

FREIRE, Paulo (1993). Política e educação. São Paulo: Cortez Editora.

LIMA, Licínio C (2008). A escola como categoria de análise em educação. São Leopoldo, RS. Unisinos, v.2(2):82-88, maio/agosto.

MOREIRA, Antonio Flavio (2010). Propostas curriculares alternativas: limites e avanços. . In: PARAISO, Marlucy Alves (org.). Antonio Flavio Moreira, pesquisador em currículo. Belo Horizonte: Autêntica.

SAUL, Ana Maria (2000). Paulo Freire e a formação dos educadores - múltiplos olhares. São Paulo: Editora Articulação universidade–escola.

SAUL. Ana Maria (2005). Paulo Freire: um pensamento atual para compreender e pesquisar questões do nosso tempo. São Paulo: Editora Articulação Universidade /Escola.


[1] O ano de 1964 marca o início do golpe de estado que instituiu uma ditadura militar no Brasil, que se estendeu por 21 anos.Paulo Freire foi preso pelo período de 70 dias, acusado de subversão pela criação de um método de alfabetização de adultos visando à conscientização. No exílio, em 1968, escreve Pedagogia do Oprimido, sua obra mais importante.

[2] Paulo Freire volta do exílio, em 1979, quando vários segmentos da sociedade civil pressionavam o governo no caminho da abertura política.A convite de Dom Paulo Evaristo Arns, cardeal arcebispo de São Paulo e grão chanceler da PUC/SP, retorna ao Brasil e se torna professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

[3] Paulo Freire assumiu a pasta da Educação do Município de São Paulo, em 1989, a convite da Prefeita Luiza Erundina de Sousa, do Partido dos Trabalhadores.

[4] A Avenida Paulista situa-se no l imite entre as zonas Centro-Sul , Central e Oeste da cidade de São Paulo; e em uma das regiões mais elevadas da cidade, chamada de Espigão da Paulista. É considerada um dos principais centros financeiros da cidade, assim como também um dos seus pontos turísticos mais característico. Em um prédio dessa avenida estava localizada a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, no período em que Paulo Freire assumiu a pasta da Educação.

[5] Trata-se do livro organizado pelos professores António Nóvoa e Michael Apple, intitulado Paulo Freire, política e pedagogia, lançado, posteriormente, no ano de 1998.

[6] A cada semestre os cursos da Cátedra anunciam um tema central. Alguns exemplos desses temas:: “Paulo Freire: 30 anos da Pedagogia do Oprimido”, “Paulo Freire: as matrizes pedagógicas contemporâneas, história e processo” , “Paulo Freire e a formação do educador: teoria e prática”; “Paulo Freire e os movimentos sociais”; “O pensamento de Paulo Freire no cenário da educação pública brasileira: política, teoria e prática”; “Referenciais freireanos para a docência e para a pesquisa”; “O pensamento de Paulo Freire na educação brasileira; análise dos sistemas públicos de ensino a partir da década de 90”.

[7] Para o desenvolvimento dos dois primeiros cursos, no âmbito da Cátedra foram convidados, respectivamente, a professora doutora Ana Maria Araújo Freire e o professor doutor Miguel Arroyo.

[8] Três livros já resultaram do trabalho da Cátedra, integrando textos produzidos pelos participantes: Paulo Freire e a formação dos educadores - múltiplos olhares, organizado pela professora Ana Maria Saul Este livro foi publicado no México e na Espanha, no idioma catalão. A Pedagogia da Libertação em Paulo Freire, livro organizado pela professora Ana Maria Araújo Freire. O terceiro livro, Paulo Freire: um pensamento atual para compreender e pesquisar questões do nosso tempo, também organizado pela professora Ana Maria Saul.

[9] Essas dissertações e teses têm a orientação da Professora Ana Maria Saul

[10] O site da Cátedra Paulo Freire pode ser acessado em www.pucsp.br/paulofreire


redLogo

N. 12 • 2012

Contactar • Contact us

Apartat 76

Tel. 34 962 28 74 16 Fax 34 962 28 74 19

46800 XÀTIVA Espanya

www.institutpaulofreire.org

info@institutpaulofreire.org

IPF
© 2023 Rizoma freireano • Contenido de este sitio bajo licencia Creative Commons Reconocimiento-No comercial-Compartir igual 2.5 España. Diseño y Mantenimiento Grupo WebMedia. XHTML y CSS

N. 12 • 2012